terça-feira, 22 de outubro de 2013

[O caso do instituto Royal] - P&D em fármacos pode dispensar os testes in vivo?

Nos últimos dias vejo uma enorme quantidade de comentários, posts, frases de ódio e indignação com relação ao uso de animais em experimentação laboratorial. Parece simples analisar esse tipo de situação quando um grupo de pessoas (chamadas de ativistas), mas que em minha opinião, são apenas grupos de indivíduos normais, que se envolvem emotivamente com as possíveis ideias que surgem sobre esse assunto. É fundamental entender, por mais que pareça cruel, que o desenvolvimento de fármacos de qualquer natureza PRECISA passar por testes in vitro (sem contato com organismo vivo) e também in vivo (em contato com organismo vivo). Acredite, um simples fármaco para aliviar dores de cabeça leva mais de uma década pra ser desenvolvido e estar disponível para a população. As coisas não são tão simples quanto parecem, ou quanto o público leigo consegue imaginar e criar nas suas cabeças.
Se eu pudesse escrever detalhadamente as etapas pelas quais um medicamento qualquer precisa passar pra poder chegar à prateleira de uma drogaria, eu ficaria horas escrevendo este post, mas o intuito aqui é simplesmente mostrar aos leigos, essas pessoas que se envolvem em protestos como o que aconteceu semana passada, que a necessidade de continuarmos buscando medicamentos, que melhorem a qualidade de vida da população, ainda supera esse nosso zelo protetivo, que cria uma barreira pra entender o uso de animais como parte de testes em laboratório e, eu nem preciso mencionar que existem órgãos e agências que fiscalizam rigidamente a prática destes testes.
Outro ponto importante nesse momento é que existem muitos “argumentos” jogados ao vento de que há métodos alternativos que deveriam ser usados ao invés da prática dos testes com animais. Sabe o que posso dizer sobre isso? MITO!!! Como eu disse desde o começo, as pessoas inventam certas ideias sobre um determinado assunto sem ao menos buscar entender os processos de pesquisa e desenvolvimento por trás de tudo.
Há sim metodologias, ainda sendo estudadas, que visam simular e até mesmo substituir alguns tipos de testes em organismos, mas esses estudos ainda são recentes e não podem, nem irão, em curto prazo, substituir as etapas de testes em animais. Os métodos alternativos em desenvolvimento, quando plenamente satisfatórios, poderão complementar a gama de fases dos testes pré-clínicos que um medicamento precisa passar, com isso, podemos esperar uma redução do uso de animais em algumas dessas etapas.
Aproveitando a oportunidade, quem acompanhou a premiação do Nobel deste ano deve ter visto que na área de Química, os cientistas vencedores trabalharam para o desenvolvimento de uma infinidade de procedimentos computacionais que contribuíram exponencialmente para o crescimento e evolução dos nossos conhecimentos sobre fármacos, tudo isso de forma virtual, acelerando mecanismos simulados em computador, que puderam facilitar o entendimento da ação de moléculas em diversas situações reacionais, incluindo, dentro do nosso organismo. Esse tipo de avanço, merecidamente reconhecido pelo Prêmio Nobel, gera uma segurança muito maior na descoberta e produção de medicamentos. O que eu quero dizer com tudo isso é que, apesar de estar evoluindo significativamente no campo das pesquisas, ainda não temos recursos tecnológicos suficientes para substituir os testes em organismos vivos que não o ser humano.

Nature Reviews Drug Discovery 6636-649 (August 2007)
Então, você deve estar se perguntando se só os pobres animais é que pagam o preço desse nosso desenvolvimento. Com certeza não, como eu disse, as etapas que evolvem os estudos para o desenvolvimento de um fármaco são inúmeras e exaustivas, temos que contar com as etapas de estudo pré-clínico, onde os fármacos previamente selecionados são testados in vitro e depois in vivo (etapas que envolvem ensaios em camundongos, gatos, cachorros, porcos, etc) e, somente com a aprovação nesses testes é que passamos para os ensaios clínicos, onde as drogas são testadas (em quatro fases distintas) em seres-humanos, desde ensaios toxicológicos, de segurança, até a aprovação pelo órgão fiscalizador responsável (Farmacovigilância).
Enfim, me parece um tanto quanto estranho ouvir pessoas criticando certas medidas em áreas tão complexas como a de drug development, sem ao menos se esforçarem para entender que quando elas estão internadas num hospital, ou com uma ordinária dor de barriga em casa, que a salvação para aquele momento dependeu exatamente daquilo que ela critica por existir.
Não é uma questão de opção usar animais como cobaias, é uma questão, por hora, de necessidade!